domingo, 1 de julho de 2012

Já não sei se quero mais ser professora




Pois bem, é verdade. Estou farta de não poder ter uma vida além desta
profissão. O facto de todos os anos nunca saber onde vou ficar
(longe?, perto?) e por quanto tempo (um mês? um ano?) impede-me, por
princípio, de me afeiçoar a pessoas e crianças que não voltarei a ver.
E o pior é que me afeiçoo sempre e acabo sempre magoada porque não
posso ficar com eles. Já para não falar nos homens por quem me
apaixonei mas que nada quiseram comigo porque "eu estou sempre de
partida"... (aqui também há aquela parte de eu me esforçar por não me
afeiçoar por "estar sempre de partida" e acabar sempre apaixonada e de
partida...)
Na verdade, já não sei bem se quero continuar a ser professora... É
uma profissão honrada, linda demais, muito, muito satisfatória, mas...
Tá-me a tirar anos de vida. Está-me a tirar momentos preciosos, amor,
amizades... Tá-me a tirar a minha vida emocional... e eu não sei se
quero mais isso... Os outros podem entender, mas, neste momento, sou
eu que não entendo...
Não sei bem o que vou fazer, mas alguma coisa surgirá... Talvez um
novo curso, ou então vou simplesmente deixar-me de merdas e ir
trabalhar em qualquer lado em que me paguem pelo meu trabalho.
E talvez um dia, quando as coisas passarem a fazer sentido outra vez,
talvez eu volte também...
Já não quero mais voar pelo país. Quero o meu cantinho nos braços de
alguém que me ame.

Ana


P.S. Obrigada Ana. Gostei muito da tua partilha, embora me preocupe por este país perder o teu profissionalismo e capacidades que tens para o que fazes.
Eli

13 comentários:

Elsa Borges disse...

Parabéns pelo blog Eli.

Quanto às palavras da Ana elas são o reflexo da vida de umas boas centenas de professores que querem e têm direito a uma vida e que infelizmente no nosso país não nos é dada essa possibilidade.

Eu também já não sei se quero ser mais professora...

Eli disse...

Elsa Borges

Muito obrigada.

Considero que as palavras da Ana estão dentro de muitos nós. Então, perguntamos:

Que fazer?!

ErnestoLopes disse...

"ou então vou simplesmente deixar-me de merdas e ir trabalhar em qualquer lado em que me paguem pelo meu trabalho."

parabéns pelas palavras sensatas Ana... desejo-lhe a melhor sorte deste mundo e tendo vontade de trabalhar de certeza que terá sucesso.

tivesse a profissão docente mais pessoas determinadas e menos choramingas que "gostam de passar o fim de semana a brincar" e estaríamos todos bem melhor.

Eli disse...

ErnestoLopes

Considera que todos os professores devem passar todos os fins de semana a trabalhar sem ter vida própria?! Asseguro-lhe que se pensa assim, está a ver a coisa de uma perspetiva muito própria, a qual não concordo.

ErnestoLopes disse...

Caríssima Eli

Comecei a trabalhar aos 14 anos; após 43 anos de trabalho árduo sou dono do meu negócio, tenho 22 pessoas na minha folha de pagamentos e, felizmente, nunca tive um salário em atraso ou uma dívida ao fisco por pagar. Por imperativos profissionais não sei o que é um fds - ofereço a mim mesmo duas semanas de férias por ano que aproveito para conhecer um país diferente. Tenho 3 filhos - 1 trabalha comigo, não quis estudar por opção; outro é Eng Civil e teve que emigrar (trabalha na Guatemala e, pasme-se, está a dirigir a obra 7 dias por semana) a minha filha mais nova é professora... neste momento efetiva, mas para entrar em quadro andou 11 anos pelo país inteiro. Nunca a ouvi chorar ou queixar-se, mesmo quando ficou colocada em Alcoutim (nós somos do Porto) e só a via no Natal e Páscoa... Felizmente hoje está bem, tem muito tempo livre (merecido, não o contesto) e deu-me já um neto que é a coisa mais maravilhosa da minha vida. Aquilo que ela me conta da escola faz-me respeitar imenso os professores que trabalham, mas o que mais a afeta são as pessoas que se queixam, principalmente as colegas contratadas que nunca quiseram concorrer para longe de casa e agora "Aqui d'el Rei que não vou ter emprego" ou que defendem o "Já que não me pagam o subsídio, tb não dou preparo aulas e os testes são de cruzinhas"... certamente conhece muitas assim, aliás, parece-me ser uma delas - perdoe-me se me engano!

O meu comentário prendeu-se acima de tudo com o tom do seu discurso, bem tuga aliás de quem está habituado a que tudo caia no colo.

Ainda sobre o tempo livre, acha mesmo que trabalhar 35 a 40 semanas num ano é muito? Não ponho em causa a dureza e exigencia psicológica do ensino nos dias de hoje, mas seja honesta...

Eli disse...

ErnestoLopes

:) Sinceramente, fiquei contente com este comentário, pois fiquei a perceber melhor o contexto e, como tal, vou contar-lhe também um pouco da minha história, incomparavelmente menor, mas vale o que vale, pois cada um sabe quanto vale a sua.

Não gostaria que este blogue se tornasse apenas meu, nem tampouco fazer-me de vítima. Apenas quero apresentar realidades...

Enfim, posso assegurar-lhe que nunca tive nada que caísse do céu... apenas ajuda da minha mãe para concluir o curso sem precisar de trabalhar para isso, embora trabalhasse sempre nas férias, no que conseguia arranjar. Como lhe referi há bocado noutro comentário, eu luto e esforço-me. Olhe, já conto com 14 agrupamentos na minha lista do Registo Biográfico, em poucos anos, fora aqueles em que trabalhei sem estar colocada. Por exemplo, quando estive desempregada inscrevi-me num POC (do Centro de Emprego) para estar a dar alguma coisa de mim e a ganhar experiência, trabalhando todos os dias dentro de uma escola não contando para tempo de serviço, com condições (...) fazendo de tudo, inclusive ficando com nódoas negras devido ao "apoio" que dava a uma aluna... enfim, não era este o meu ponto, mas gosto de escrever o que me sai e gostaria também que soubesse que se criei este blogue foi porque achei que tinha alguma coisa para dizer e que haveria muita gente a identificar-se comigo e com situações de colegas que estão (ou não) como eu. Daí ser um blogue aberto.
Ainda não lhe disse que comecei a trabalhar oficialmente, ou seja, colocada, nos Açores, concorrendo nesse ano para todas as nove ilhas, mais as da Madeira e para todo o continente. A partir daí, tento reduzir um pouco as minhas escolhas, mas nunca tive um mês sequer a trabalhar e a morar em "casa". Quando estou em casa é sinal que estou desempregada.

Ah, eu também só vinha no Natal e na Páscoa, portanto deve saber do que falo. Ainda neste ano letivo, no Continente, só fui duas vezes a casa por período devido não tanto às distâncias, mas às despesas que teria com elas.

Este ano só não concorri para a Madeira, porque não há vagas. No ano passado foi colocada uma única pessoa (no meu grupo na primeira lista...). Portanto, resolvi ser sensata.

Este ano voltei a concorrer para os Açores, tendo estado um ano apenas concorrendo para o Continente. E, se eu tenho colocação neste momento é porque já percorri praticamente o país inteiro em substituições temporárias e vou voltar a concorrer a nível nacional quando chegar a altura da Manifestação das Preferências.

Depois de ter lido que a sua filha tem direito ao seu tempo de descanso, espero que tenha percebido que também eu o tenho. Eu gostava de conhecer também outros países como o senhor no meu tempo de férias, mas o receio de não voltar a trabalhar, faz com que não me aventure a gastar o pouco que tenho. Sinceramente, acho que pelo seu percurso merece mais descanso. Aproveite a vida, porque eu, apesar de estar SEMPRE longe, construo aqui e ali e é a lutar que sobrevivemos.

E, se estou nesta profissão é porque realmente gosto mesmo do que faço, embora me passem algumas ideias que a Ana referiu também pela cabeça.

Cumprimentos,

Eli

Brown Eyes disse...

As palavras da Ana estão dentro de professores e não só. Quem deseja hoje continuar a trabalhar neste país? Ninguém. Quem conheceu a funcionalidade do país há uns anos atrás e quem o conhece hoje. O sentimento que os trabalhadores sentem foi provocado para que assim pudessem fazer todas as alterações possíveis e imaginárias e não tivessem oposição. Querem escravos, não trabalhadores esforçados e esmerados.
Beijinhos

Eli disse...

Brown Eyes

É uma reflexão atualizada e com todo o sentido. Muito complicado deixarmos de poder acreditar somente no nosso trabalho e esforço para alcançar um futuro, embora não tenhamos outrs hipótese, seja nesta ou noutra profissão.

:)

Maria disse...

Bom Dia !
Cheguei neste blog poque não quero mais ser professora. Sou efetiva no Estado de Minas Gerais e não vou repetir os discursos acima pois é sempre os mesmo. alguém tem alguma sugestão? Pensei em fazer técnico em mineração. ou informática.

Eli disse...

Maria

Gostaria de ter uma sugestão concreta para te dar. Neste momento, estou nas AEC, que são as Atividades de Enriquecimento Curricular após o término das aulas, no final do dia. É um horário de 10 horas, mas é muito bom, pois neste momento, em Portugal, não há mais nada para alguém como eu, apenas contratada quando há vagas.

Força! :)

Alexandra Santos disse...

Subscrevo as palavras da Ana...


todas nós passamos pelo mesmo, invariavelmente!

Mas abandonar o meu país, não vou... se morrer, morro aqui!


beijo!

Anónimo disse...

Conclui o meu curso de pedagogia,mais nao consigo emprego e vejo tanta desigualdade em minha area,nao quero mais ser professora o que fazer?

Eli disse...

Não sei que fazer, mas há que reinventar... Força!